quinta-feira, 3 de novembro de 2011

1-3-4-3: Dinâmicas da Organização Defensiva e Ofensiva

Alguns apontamentos sobre os sistemas defensivo e ofensivo do 1-3-4-3 na tentativa de explorar melhor suas possibilidades

“A autonomia organizada no jogo de futebol (dos seus elementos),
pressupõe liberdade e sentido para a ação”
(Leitão, 2009)

A disposição dos jogadores em um campo de futebol costuma dizer pouco sobre o que realmente é a equipe. A partir de um desenho pré-definido para a ocupação do espaço de jogo, há uma intenção (jogadores - individual e equipe - coletiva) em manter essa organização durante a partida, pois isso é visto como algo vantajoso para o êxito dentro de campo. O esquema tático ou plataforma tática (Leitão, 2009) varia entre as equipes e dentro da mesma equipe ao longo dos jogos. Passando para as possibilidades dentro das plataformas, essa variedade se torna praticamente infinita.
Serão exploradas algumas situações pontuais dentro do sistema defensivo e ofensivo do 1-3-4-3 (equipe amarela nas figuras) com o meio de campo estruturado em um losango. Neste momento, não serão abordadas situações de transição (ofensiva e defensiva) especificamente.
   
- Sistema Defensivo: basicamente, as situações estão relacionadas à ocupação do espaço.


Figura 1 – Flutuação e Equilíbrio Horizontal

Na figura 1, a equipe amarela flutuou para o lado da bola na tentativa de gerar superioridade numérica, com as linhas de defesa (3 jogadores) e meio (4 jogadores) bem agrupadas permitindo pressionar a bola nessa zona do campo. Como consequência desse movimento, o lado oposto fica fragilizado podendo ser explorado pelo adversário. No “1-3-4-3 losango” as linhas de defesa e meio são “estreitas”, a de defesa pelo número de jogadores (3) e a linha de meio campo pela disposição no espaço (a figura de um losango). Isso faz com que os atacantes que jogam abertos tenham que trabalhar muito defensivamente, aquele do lado da bola pressionando o espaço (na figura acima ele está gerando pressão por trás do portador da bola) e o outro atacante deve ocupar a faixa contrária a da bola, mantendo um bom equilíbrio horizontal.  

 
Figura 2 – Estruturação do espaço na Pressão Alta

Numericamente, o 1-3-4-3 favorece a ocupação do campo adversário. Porém, deve-se concentrar em não permitir que a bola saia do campo de ataque de maneira confortável para o adversário, pois essa vantagem numérica se reverte em desequilíbrio defensivo. Para isso, duas questões são fundamentais: pressão na bola e gestão eficaz do espaço. Na figura 2, pode-se observar dois desenhos de meio campo pressionando alto, um com uma figura de maior área (à esquerda) e outro com uma figura de menor área (à direita). Com maior espaço ocupado, pode-se pressionar a bola em zonas mais variadas caso o adversário consiga manter uma boa circulação sob pressão. Um losango menor, mantêm mais jogadores próximos à bola dificultando sua saída dessa região do campo. É uma questão de leitura (individual e coletiva) e aplicação da melhor resposta de maneira circunstancial.

- Sistema Ofensivo: as situações abordadas relacionam-se a primeira fase de construção e ao ataque ao espaço na última linha.

Figura 3 – Circulação da bola no campo defensivo

A forma como os jogadores da equipe em posse que estão sem a bola ocupam o espaço tem total interferência na capacidade de circulação e de retirada da bola das zonas de pressão construídas pelo adversário. Na figura 3, num primeiro momento (à esquerda), o portador da bola tem duas opções de passe, uma bola curta e outra média com certo risco de perda. Nenhuma opção de passe em progressão. Com duas movimentações (à direita), foram construídas quatro opções de passe, sendo uma em progressão e o campo foi aumentado para trás (goleiro). Com mais opções, fica dificultada a ação pressionante da equipe vermelha, essa situação gera mais momentos de indecisão à equipe sem bola.    

Figura 4 – Ataque ao espaço pelo meia ofensivo

O meia ofensivo do losango, pode criar superioridade numérica na linha de ataque sempre que atacar os espaços na linha de defesa no tempo correto. Jogando contra equipes que jogam com linha de quatro defensores e marcam individual por setor sustentando um defensor “na sobra”, realizando a cobertura na zona central, haverá espaço nos corredores entre os zagueiros e os lateriais conforme está destacado na figura 4. Além dessa situação descrita especificamente, o entendimento do conceito de atacar o espaço nos corredores da linha, sempre se tornará um comportamento vantajoso, independentemente se a bola for passada ou não. Caso enfrente uma equipe que marca por zona, esse movimento poderá contribuir para “empurrar” a defesa para trás quando não houver pressão na bola, criando espaços na frente da linha defensiva.
Tão importante quanto entender essas questões estratégicas, é perceber como a equipe responde aos problemas e se essa resposta está sendo efetiva para solucioná-los. É fundamental que os atletas entendam o significado de cada movimento da equipe para que possam alinhar com sua percepção do jogo.


Referência Bibliográfica

Leitão, R.A.A. O jogo de futebol: investigação de sua estrutura, de seus modelos e da inteligência de jogo, do ponto de vista da complexidade. Tese de Doutorado em Educação Física. Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). 2009. Campinas. 2009.


Leandro Zago

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

As Estruturas e as Interações da linha de meio campo e de ataque da equipe do FC Barcelona

A partir das Estruturas construídas no campo de jogo muitas dinâmicas acontecem na Interação entre os jogadores resultando em um futebol atrativo e efetivo

“Existe alguma coisa a mais na vida, alguma coisa
não-material e irredutível – um padrão de organização”
(Capra, 2006)

O Futebol apresentado pelo Barcelona, nos últimos sete anos principalmente, tem chamado a atenção de todos que acompanham essa equipe. Pela forma como os excelentes resultados que vem sendo obtidos (em uma parte considerável desses resultados há uma grande diferença de gols pró equipe catalã) são construídos, de uma maneira muito consistente, alguns fatores emergem como destaques positivos. Dentro de uma cultura de jogo muito definida (pode-se dizer também que há uma cultura do clube que engloba uma cultura de jogo com interferência bidirecional), os corportamentos de jogo (em sua maioria) são balizados por essa cultura, tendo por consequência padrões de movimentação que, apesar de bem sistematizados, interagem bem com o jogo do adversário criando as adequações necessárias na grande maioria das vezes em que é preciso para resolver as adversidades que o jogo propõe.  
O Jogo do Barcelona é contruído numa Plataforma Tática de 1-4-3-3 com um goleiro muito ativo dentro dos quatro momentos do jogo (organização ofensiva, transição ataque-defesa, organização defensiva e transição defesa-ataque), uma linha de quatro jogadores a sua frente muito habituada a jogar “alta” (avançada), um meio campo com três jogadores disposto estruturalmente em um triângulo apontado para trás e três atacantes que mantêm com uma certa regularidade também uma estrutura em triângulo, porém apontada para a frente. O foco desse artigo está prioritariamente nesses dois triângulos formados pelos seis jogadores (linha de meio campo e de ataque), porém sem jamais desconsiderar que sistemicamente estão intimamente relacionados com as dinâmicas de toda a equipe, como será visto a seguir.  
 
Figura 1 – A regularidade da emergência das Estruturas
Como pode-se observar na Figura 1, as estruturas estão presentes nas mais diversas situações e obviamente deformam-se, aproximam-se, sobrepõe-se, se afastam, ou seja, realizam uma gama muito ampla de movimentos para resolver os problemas propostos pelo jogo.

Figura 2 – Estruturação do espaço com bola

Na Figura 2, o Barcelona está em Organização Ofensiva, com um relativamente bom espaço efetivo de jogo e com mais jogadores para trás da linha da bola (campo grande para trás), criando uma situação mais favorável à circulação e manutenção da posse do que de progressão. É interessante observar a reação da equipe como um todo e dos jogadores (elementos) se comportando simultaneamente para atender essa necessidade (manutenção da bola). São as convenções coletivas da qual todos compactuam, construídas dentro do processo de treinamento que alguns jogadores dessa equipe vivenciam desde o início da formação nas categorias de base do clube, que permitem tal feito com tanta eficácia.

Figura 3 – Sobreposição de Estruturas e Compactação

Com a defesa avançada (tentando diminuir o espaço efetivo de jogo do adversário “dentro” da equipe) há uma sobreposição devido a subida dos meias (Iniesta e Xavi) que estão tentando pressionar a bola para desqualificar (no sentido de diminuir a qualidade) qualquer tentativa do adversário. É o “campo pequeno a defender” neste caso, porém com um espaço muito grande para ser gerido nas costas da linha de defesa. Pode-se observar que mesmo em situações como esta, a Plataforma Tática 1-4-3-3 está mantida e muitas estruturas em trângulo (estruturação do espaço típica do modelo de jogo da equipe) poderiam ser construídas selecionando aleatoriamente quaisquer três jogadores. 


Figura 4 – Manutenção das Estruturas deformadas

Assim como nos outros três momentos, em organização ofensiva, os jogadores se relacionam intra (relações internas do setor) e inter (relações com outros setores) setorialmente para que a macro-estrutura Equipe possa atingir seus objetivos (marcar gols e vencer a partida). Na tentativa de desequilibrar o adversário, várias trocas acontecem, jogadores “atacam” espaços vazios, o lateral oposto mantêm a boa amplitude da equipe, atacantes se aproximam e se afastam, alguns jogadores ficam em zonas sem pressão para uma necessidade de retirada da bola da zona de pressão e outra infinidade de possibilidades. Segundo Capra (2006), a estrutura do organismo apenas “condiciona o curso de suas interações e restringe as mudanças estruturais que as interações podem desencadear nele”. Portanto, a estrutura deve ser vista como meio, não como fim. A finalidade da preparação para o jogo deve sempre manter relação com os objetivos do jogo (marcar gols e impedir os gols do adversário) e a contrução de estruturas tanto fixas como móveis deve estar subjulgada a isso.

Figura 5 – A mobilidade como princípio estrutural de ataque do FC Barcelona

Há interações permanentes em uma equipe de futebol. Em todas, sem exceção. A qualidade das interações é algo único, que pertence a cada equipe, sendo um dos fatores que dão identidade à ela. Os princípios de jogo que regem essas estruturas vão diferenrenciá-las em fixas e móveis (figura 5). Basicamente, nas estruturas fixas poucas trocas acontecem (como no caso da linha de defesa do Barcelona) com uma maior rigidez posicional e as estruturas móveis são caracterizadas por muitas trocas (linha de meio campo do Barcelona, principalmente os jogadores Xavi e Iniesta). Interessante como independente do tipo de estrutura da equipe, a mobilidade ocorre sem descaracterizá-la também organizacionalmente.    
Ao direcionar o olhar para as estruturas, deve-se ter muito claro que existe uma dinâmica permanente que a mantêm, não é algo estanque, parado, morto. E a “vida” que a equipe manifesta surge desse movimento constante.

Referência Bibliográfica
Capra, F. (2006) A Teia da Vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Editora Cultrix.

Leandro Zago